Tempo de morangos

Como dizia Clarice Lispector arrematando A hora da estrela e a sua própria vida: “Não esquecer que por enquanto é tempo de morangos. Sim.”

Caio Fernando Abreu in “Cartas.”

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Segredos pequenos

Tento conviver — convivo — mas é, quase sempre, uma violação incrível. Tenho vontade de ter segredos outra vez. Guardo segredos pequenos — as coisas que penso ou sinto, pequenos acontecimentos que não descrevo à “comunidade”.

Caio Fernando Abreu in “Cartas.”

Carta ao Amor Ausente – I

D.

Soube apenas tarde da noite que você havia enviado uma carta. Oh deus, há quantos anos não nos falamos?
Fico feliz em saber que tua filha melhorou daquele problema de saúde. E entendo tua outra preocupação.
Mas a gente também não era assim?
A gente tinha quanto? Treze, quinze anos? A gente já era adulta demais. Éramos responsáveis por uma reunião semanal de um grupo de adolescentes que tinham a mesma idade que a nossa ou um pouco menos. Na verdade, fomos muito mais que isso. Fomos mães, irmãs, filhas e namoradas de todos eles.
E a vida não é exatamente isso? Trocar experiências, crescer com elas, ter amigos e cuidar.
A gente se envolvia demais também, ou vai me dizer que você é dessas que olha para o passado com um filtro sépia? O passado foi difícil também. Eu lembro de cada história que não é minha, mas eu ouvi e sofri junto. E aconselhei, não com propriedade de quem viveu muitos anos ou tinha  mais experiências. Aconselhei como quem se preocupa e ama incondicionalmente, e quis o melhor pra todo. Nunca soube se deu certo, mas fiz com amor.
Aconselhei você também, muitas e muitas vezes. E nunca é tarde para mais um: deixe que ela ame.
Ela é igualzinha você, percebo agora. Vocês são do tipo que se envolvem de alma e sofrem junto.
A gente se constrói assim, com desafios, desabafos e decepções. Na verdade, não é de sonhos que somos feitos, somos feitos de suor e lágrimas, de tristeza e alegria.
Deu certo para gente, não deu? Eu tenho muito orgulho de quem somos hoje. Eu e você.
Quanto ao seu sonho, ah que sonho lindo!
Um dia vou realizá-lo. Talvez não nesses detalhes. Como lhe disse antes, um passo de cada vez e uma hora eu chego onde desejo. Ou além, como seu sonho.
A verdade é que ando sonhando pouco e baixo. Uma hora eu acordo e volto a ser sonhadora.
Vontade não me falta de subir as escadas daquele avião e dizer “sempre teremos Paris”.
Depois de tantos anos, a gente ainda se preocupa.
Cuidar dos outros é indiretamente cuidar da gente também. Alivia nosso coração.
Cuide-se.
Fica com Deus.
Sempre teremos “Paris”.

F.

Nada bonito

Tantos trancos. E o meu olho nem conseguindo ver mais nada bonito.

Caio Fernando Abreu in “Cartas.”

Que a tristeza não deixa durar

Tem um verso de Camões assim: “Este amor ledo e cego que a tristeza não deixa durar muito”. Pois é.

– Caio F.Abreu in “Cartas”

Pelas coisas que quer

A gente aprende a se defender e a lutar pelas coisas que quer.

– Caio F.Abreu in “Cartas”

Meu caminho

Tem uma coisa dentro de mim me dizendo que o meu caminho é exatamente este, e que não posso nem devo tentar modificá-lo.

– Caio F.Abreu in “Cartas”

Unilateral

Penso, com mágoa, que o relacionamento da gente sempre foi um tanto unilateral, sei lá, não quero ser injusto nem nada — apenas me ferem muito esses teus silêncios.

– Caio F.Abreu in “Cartas”

A melhor vingança

Não se perca. Não se esqueça. Viver bem é a melhor vingança.

– Caio F.Abreu in “Cartas”

Exausto

Tô exausto de construir e demolir fantasias. Não quero me encantar com ninguém.

– Caio F.Abreu in “Cartas”